Umberto Eco, o famoso escritor italiano de livros como "O Nome da Rosa", em 10 de junho de 2015, disse que "...as redes sociais também deram voz àquela conversa de bar que não leva a lugar nenhum". Concorde você (total ou em parte), o escritor já detectava o "cheiro incomum" dos abacaxis e abobrinhas cozidas contaminando esse imenso caldeirão de opiniões.
A esperança está, como de costume, na análise dos fatos, dos números. O resto é canção de ninar. Tragam os números, e vamos analisa-los. Deixe-me ver os seus casos em função do tempo.
Esses "respingos raivosos" atingiriam a Odontologia. Era questão de tempo. Na Implantodontia, por exemplo, quando falamos do tratamento com implantes dentários contemporâneos, o objetivo é a melhora na qualidade de vida. Porém, os mais atentos já percebem: todo o tipo de "sincericídio" relacionado ao tema provoca uma onda automática de pugilismo virtual.
Lógico, eu me refiro ao dilema da preservação de dentes e osso remanescente. Com tantos recursos diagnósticos disponíveis, com tudo o que sabemos hoje sobre o prognóstico dentário, ainda vemos "nesse" ou "naquele post" as propostas "atípicas" de tratamento com implantes dentários".
Basta acompanharmos o resgate histórico abaixo (com fatos e imagens) para entendermos porque os implantes dentários contemporâneos, quando bem indicados, continuam os grandes "divisores de águas" em nossa prática moderna e como foi difícil convencer nossos pacientes que uma nova era se iniciava:
De acordo com o Glossário de Implantes Buco Maxilo Faciais (GOMI), o implante metálico da foto acima é conhecido como subperiosteal. Você também o conhece como justa ósseo, ou seja, após a abertura do retalho, ele é colocado como se fosse a sela no cavalo. Seus pilares protéticos são transmucosos, ligados diretamente à estrutura metálica do seu corpo. A restauração definitiva (prótese total, por exemplo) é cimentada.
Detalhe: para fazer esse tipo de implante, era necessário moldar o osso (sim, isso mesmo, em campo aberto). Depois, a estrutura era conformada segundo a anatomia obtida. Observe na imagem acima os contornos ondulados que se ajustam ao rebordo residual. Sem escaneamento intraoral, sem desenho (CAD) e sem máquina de usinagem (CAM). Puro artesanato e técnica.
Mas este não era o único tipo: havia também o implante em forma de lâmina, classificado como endósseo, ou seja, ficava dentro do osso. Basta olhar para o tamanho da peça (imagem abaixo, na arcada mandibular) e imaginar: o tamanho da canaleta obtida com a broca, a invasividade do procedimento, a habilidade cirúrgica necessária para não lesionar o canal do nervo mandibular, o perfil de emergência muitas vezes desfavorável na coroa protética.
O implante em lâmina também possuía os transmucosos conectados diretamente ao corpo da sua grade. A prótese definitiva era cimentada. Repare que na imagem abaixo, a maxila possui um implante subperiosteal (justa ósseo).
Sim, para os caçadores de desenhos de implantes dentários, falta o agulhado. Peço desculpas aos leitores e leitores do meu blog, mas não encontrei uma foto exemplo nos meus arquivos. Porém, imaginem um tripé de agulhas dentro do osso, o componente transmucoso ligado ao tripé, e a coroa unitária (cimentada).
E o que aconteceu com esses pacientes e esses tipos de implantes?
No ano de 1977, o NIH (Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos), mediante um consenso sobre os riscos e benefícios dos implantes dentários (imagens acima). Mais tarde na publicação de 1979, as taxas de sobrevivência correspondentes aos subperiosteais variavam de 36% e 90%. Para os laminados, entre 65% e 90%
Não somente as variações eram imensas (e compreensíveis pela época e tecnologia disponível), mas também o número de implantes avaliados inconsistente de uma fonte à outra. O próprio artigo já alertava para a necessidade de reportar melhor esse tipo de tratamento, já que os dados fornecidos pela clínica que mais controlou seus procedimentos chegava aos 75% de sobrevivência após 5 anos de acompanhamento.
A conta é simples: basta comparar a taxa de sobrevivência desses desenhos de implantes com a estimativa de perda 5% nos implantes dentários contemporâneos e entender que o risco significativo no primeiro cenário apresentado.
A melhora nas taxas de sobrevivência só aconteceria com a chegada dos implantes dentários contemporâneos (representado na imagem abaixo). Esse desenho reduzia a invasividade da osteotomia, abreviava o tempo total cirúrgico, e possibilitava que a prótese fosse desconectada dos implantes para receber manutenções periódicas. Praticamente mudou a história da indústria de micro usinagem, abriu centenas de empregos e novos caminhos.
Durante todo esse tempo, em diferentes locais do mundo, com diferentes profissionais, as taxas de sucesso se aproximaram dos 95%, porque esses implantes foram usados ora em pacientes totalmente edêntulos, ora envolvendo a estética ou o edentulismo parcial. Entretanto, ao escrever cada capítulo de livro ou artigo, a preocupação máxima estava na fase de seleção dos pacientes. Eram estes pacientes candidatos ou não ao tratamento com implantes dentários?
Este é o fato que centenas de posts nas redes sociais ainda não entenderam.
Afora os números já descritos, e toda a retrospectiva histórica, tudo isso não impede que um implante "falhe" ao longo dos anos (mas que seja bem tarde, que nossos pacientes possam usa-los com toda a sua capacidade). Ainda, uma vez bem planejado e executado, que esta chance de falha seja muito pequena.
Paciência: "o tempo é o senho da razão".
Comments